Este artigo foi escrito pouco tempo antes do Multixplique ir para o ar. A publicação foi feita no Linkedin, que foi meu local de testes para enfim criar uma página dedicada a assuntos financeiros em geral.

O objetivo deste artigo é falar de um assunto que é tabu em diversas famílias. Não somente com criança, mas casais também.

Acredito que falar sobre dinheiro deveria ser tão comum quanto falar sobre o dia a dia no trabalho, falar sobre as próximas férias, sobre os planos sobre ter filhos, sobre saúde.

A maioria dos casais e famílias só estão endividados ou com sérios problemas financeiros porque não conversam sobre dinheiro.

Falar sobre dinheiro precisa ser assunto frequente em família, muitas das vezes, na presença dos filhos, independentemente da idade.

Antes de que você continue a ler este artigo, quero deixar claro que sou atuário, profissional de exatas, portanto, não sou psicólogo, não estudei de forma profunda os efeitos psicológicos que podem aparecer nas pessoas quando se tornarem adultas. É apenas a forma como eu pratico hoje na minha vida com minhas filhas e tenho observado resultados que no meu ponto de vista são extremamente enriquecedores (opa, que ótimo duplo sentido, rs). Contrariando o ditado, na casa deste ferreiro aqui, o espeto não é de pau.

É claro que há uma clara questão de maturidade. De acordo com a idade de seus filhos, você precisará escolher bem as palavras. Mas, antes de seguir, vamos parar para fazer uma analogia. Por exemplo, falar sobre sexo com seus filhos. Gosto de fazer este paralelo porque é no mínimo diferente ter que falar sobre este assunto com os filhos. Quero deixar claro que não me refiro a explicar o que é o sexocomo os bebês “entram” na barriga da mãe, ou o que é uma relação sexual. Se seu/sua filho(a) não lhe fez uma dessas perguntas ainda, prepare-se… é questão de tempo.

Quando me refiro a falar sobre sexo com filhos, sempre haverá um limite do que você irá contar, por exemplo, como é a relação entre você e seu cônjuge. Desculpem-me, mas eu afirmo logo que não estou preparado para essa conversa e acredito que nem os filhos estejam interessados. Está aí um limite.

Explicado este ponto, vamos voltar para o assunto #dinheiro. Você não irá ter conversas em família dando satisfação do que você faz com seu dinheiro a cada movimentação que você faça na sua conta bancária, ou no seu cartão de crédito. Não se preocupe, você continuará com sua privacidade.

Por outro lado, você também não se deixe enganar achando que ao dizer para seus filhos e seu cônjuge quanto custa o plano de saúde da família, o aluguel ou prestação do financiamento da casa que vocês moram, o custo de água, luz, internet, telefones, TV por assinatura entre tantas outras despesas que você já se considera uma pessoa que conversa sobre dinheiro com as pessoas que moram com você.

Prepare-se para o que vou te dizer agora: você não só não está falando o que deveria, ou seja, o que realmente importa, como você também está atrapalhando e confundindo a cabeça de quem escuta (ouvir com atenção) o que você está falando.

Por que?

A resposta é simples, você está dizendo para eles que os responsáveis financeiros pela casa dão conta de todas essas facilidades/necessidades que vocês tem e definiram como importantes na vida de vocês. Não estão explicando o que realmente deveria ser dito, tais como, o quanto custa (em nº de horas de trabalho) pagar cada um desses itens. Ah, e você certamente não está falando sobre os impostos. Porque você precisa fazer essa conta depois de descontar os impostos.

Aliás, aprender a fazer a conta sobre tudo que você compra ou consome dessa forma (em nº de horas líquidas de imposto) é uma excelente maneira de refletir sobre sua próxima aquisição. Posso garantir que se você tiver essa “calculadora” disponível, no mínimo surgirá no seu subconsciente a seguinte pergunta: “eu preciso mesmo disso?”

Eu sou de uma época, e provavelmente se você tem mais de 30 anos é também (e não tente fingir que não é), que as mães diziam algo parecido com “Desliga essa luz! Está pensando que sou sócia da Light?”. Para quem não sabe, a Light é a distribuidora de energia no Rio de Janeiro.

Minha mãe

Dona Rosa não sabia investir em ações e certamente aprendeu essa frase com a minha avó. Porém, era bem típico dela dizer isso e provavelmente a sua também. Que saudade! Essa era das poucas vezes que conversávamos sobre dinheiro dentro de casa. Eu a vi incontáveis vezes fazendo contas na mesa da cozinha, nervosa, fazendo seu controle em papel de pão (de verdade). Viúva, professora do município e com um casal de filhos estudando em escola particular, minha mãe levou uma vida muito regrada, sem luxos, mas, sem dívidas. E como ela conseguiu isso? Aprendeu com meus avós.

Nós falávamos sobre ter dinheiro, mas eram sonhos, da mesma forma como hoje em dia nós todos falamos o que faríamos se ganhássemos na Mega Sena. Mas isso não é falar sobre dinheiro, não se iluda!

Voltando para o ponto principal deste artigo, vamos falar de conversar sobre dinheiro com filhos e ainda de ser exemplo. Característica necessária de um líder numa carreira profissional, mas também muito importante no líder da casa. Não adianta nada você comandar e não ter a atitude compatível com seu discurso. Portanto, esteja preparado para falar sobre esse assunto, em família, especialmente com seus filhos.

Portanto, você, a partir de agora, tem um dever de casa, literalmente, um #homework.

  • Conhecer suas despesas fixas e variáveis, essenciais e supérfluas, contínuas e temporárias.
  • Comece pelas fixas e essenciais e tenha em mente quantos dias do mês você precisa trabalhar para poder pagá-las. Se achar melhor, faça em horas de trabalho.
  • Pense no que você faz errado hoje que você gostaria que seus filhos aprendessem com seu erro. Acredite, mostrar nossas fraquezas diz muito mais sobre você ser humilde de reconhecer o que errou além de mostrar que você aprendeu através do erro. E não quer que eles cometam os mesmos erros que você.

A conversa

  • Sem dúvidas, a primeira vez que você for falar sobre isso lhe deixará um pouco incomodado. Na verdade você está deixando sua zona de conforto. Mas não deixe que isso seja mais forte do que os benefícios quer você irá trazer para sua vida e para a vida de seus filhos.

Se você tem filhos bem pequenos (a partir de 5 anos até 10 anos), comece ensinando conceitos simples, tais como: quando você deixa de gastar com alguma coisa você tem a chance de colocar esse dinheiro para crescer.

Explique que funciona como se fosse uma plantinha, que você coloca dentro de uma terra. Use um cofre dentro de casa (de preferência infantil) e aos poucos transfira para um banco.

  • Com o passar do tempo, o que acontece com a planta? Ela cresce. Pronto, diga que com dinheiro é a mesma coisa. Quer uma sugestão, vá para o Google e busque imagens, tais com essa que escolhi.

Compre um cofre para cada filho. Comece com o primeiro depósito em moedas. Não importa o valor, o que vale agora é o que aquela moeda representa simbolicamente. Ensine a criança a colocar a moeda e comemore. Depois de alguns dias, o que recomendo que seja pelo menos 30 dias, sem que ela perceba, você coloca escondido mais umas moedinhas.

Quanto a escolher um cofre que tenha como abrir ou somente quebrando, isso é com você. Com minhas filhas eu digo que não pode mexer no cofre porque atrapalha a produção de novas moedas. E elas morrem de medo de interromper a produção, rs.

Esse simples gesto que você fez insere na cabeça dos seus filhos que guardar dinheiro rende um pouco e este pouco rende mais um pouco. Acredite ou não, ela já está aprendendo sobre #juroscompostos. Quantos adultos não entendem isso?

E mais, seus filhos, suas crianças, vão passar a agir de forma diferente com o dinheiro. Vão parar de querer balas, doces ou qualquer coisa que vejam se forem autorizadas a usar seu próprio dinheiro. A propósito, tem também a mesada.

Coloquei aqui a imagem de uma tabela de mesada, feita por alguns pais. Particularmente eu não uso, mas há quem possa gostar dessa idéia e querer aplicar.

Mesada é muito importante! Ter uma mesada é um primeiro bom exercício para verificar como a criança se comporta quando ela tem a liberdade de escolha. Quando ela entender que o valor do troco que ela trouxer pra casa fica pra ela, você não deve, (eu disse que você não deve, hein?) falar pra ela a seguinte pérola “corre lá pra colocar no cofrinho”. Ao invés disso, diga… “quanto você acha que dá pra colocar no cofrinho deste troco que você tem aí?”.

Percebeu a diferença? Ela terá ainda como definir que parte do bolo irá ser usado agora e qual parte ficará para um futuro! Alguma semelhança com a nossa vida hoje?

Pois é, são os dilemas que chegam para uma criança, que ela vai se acostumar a lidar desde pequena.

Com o tempo, você diz que quando o cofre encher você precisa colocar num lugar “seguro”, pois o cofre pesado produz mais devagar. E assim você já abre uma conta corrente, em um banco digital por exemplo, já no CPF da criança e começa a fazer os primeiros investimentos. Aqueles que quiserem saber como inscrever em uma corretora de valores, pode me procurar que eu ajudo. Mas isso é um passo à frente, ok?

A criança não precisa saber o quanto tem, o quanto rendeu. Aí sim, diga que é um assunto que ela não deve se preocupar agora. Que é bom ela não saber porque ela ficaria até com vontade de comprar alguma coisa agora e isso atrapalharia ela de ter algo que ela quer muito.

Veja que esse dinheiro que passou a ser aplicado não está impossibilitado de ser sacado. É preciso saber dosar. Não adianta nada estimular a parte do saving se não existirem as recompensas no meio do caminho. É outro ensinamento que você irá permitir que seus filhos tenham.

Com o avanço da idade das crianças, elas já vão entrar na fase de entender aquela matemática de horas de trabalho necessários para ter o padrão de vida que elas tem. Pode começar falando de algo que interesse a ela. Não pense que se você disser que você gasta 4 horas do seu 1º dia do mês pra ela ter luz dentro de casa. Isso não vai fazer a menor diferença pra ela, acredite! Diga por exemplo o telefone celular que ela tem, o plano de dados dela. Algo que afete diretamente o mundo dela. Não precisa ser necessariamente caro, pode ser uma pizza que ela adora, aquela jantar no Outback, no McDonald’s.

Claro que isoladamente cada item desse não representará, em geral, um número de horas muito alto, certo? Mas, e a soma de tudo isso? Já muda um pouco né? Daí você pode falar o que quiser, como aquela roupa que ela adora usar, o relógio que ela quer, o tablet que ela tanto pede. O show que ela quer ir…

A viagem pra Disney! Nossa, quantos meses de trabalho hein? E ela vai sozinha pra lá? Não!!! Vai a família toda! Pronto. Outra grande oportunidade de ensinar aos seus filhos que sonhos maiores pedem esforços maiores (mais horas de trabalho, cansaço, sacrifícios como deixar de comprar alguns itens não essenciais, e assim por diante).

Resultado final

Qual o resultado de tudo isso? Não pense que é uma fórmula infalível, que promete um determinado número de meses uma mudança radical em sua vida.

Traga todos para o projeto!

Você precisa começar, ter a iniciativa. Porém, não se esqueça que a “continuativa” e a “acabativa” são ainda mais importantes. Por isso, não esqueça:

  1. Regularidade – Não adianta nada você fazer uma vez e depois não falar mais. Você também não pode ter esse tipo de conversa quando você achar que deve e ficar 3 meses sem falar nada. Crie um hábito, por exemplo, uma ocasião como referência. Pode ser no jantar de família aos fins de semana, pode ser na hora de colocar as crianças para dormir, na hora que vocês estiverem fazendo algo juntos que não exija exclusividade. Quando você tenta fazer uma “DR”, qual a primeira impressão do seu cônjuge? Alegria ou irritação? A mesma coisa será com seus filhos. Você irá contar a eles como se fosse uma história, escolherá bem as palavras e irá deixando seu filho confortável para perguntar o que quiser. Isso ajudará você a explicar o porquê de dizer tantos “não” para tantos pedidos…
  2. Sinceridade – Mostre sempre a verdade para eles. Mesmo que novos, eles devem entender como seus pais administram as suas finanças. Com uma atitude dessas, demonstrar que você pode estar gastando além do que poderia, ou guardando menos do que deveria ser um pedido de apoio ou ajuda para melhorar a forma como vivem atualmente. Ao dividir essas questões (quanto você tem disponível todo mês para gastar), sendo muito ou sendo pouco, permite aos seus filhos perceber que há escolhas que são feitas todos os dias. E mais importante: cada escolha tem uma consequencia. Isso conscientizará seus filhos a escolherem o que desejam para eles. Pode ser que eles sejam a força motivadora que você precisa para administrar melhor suas finanças.
  3. Seja o exemplo – Pais gastadores formam filhos gastadores. Pais poupadores, geram filhos poupadores. Reflita sobre isso. Seja para os seus filhos a referência positiva que você gostaria que eles fossem na vida.
  4. Envolvimento – Uma grande forma de começar uma conversa é convidar todo mundo para participar de um “grupo”, um grande plano. Definam um sonho. Pode ser “comprar um carro melhor”, “fazer uma viagem dos sonhos”, “mudar de endereço”. Convide todos a fazer parte desse projeto da família. Isso faz uma diferença! Eles vão ser parte da execução e não apenas estarão na torcida para você conseguir!
  5. Estipule um prazo – Defina um prazo possível. Se for sua primeira vez, crie um plano para um prazo curto, de até 6 (seis) meses preferencialmente, que seja possível, que não esteja já pronto, que seja mensurável e possa ser desmembrado entre todos e, principalmente, que seja do interesse de todos. Só assim você tera o engajamento que precisa.
  6. Acompanhe – Periodicamente, acompanhe os avanços, mostre os resultados e se for preciso, redefina o rumo e discuta sobre o que não funcionou.
  7. Comemore – A cada avanço, celebre cada conquista. Tem coisa mais motivadora do que festejar um degrau conquistado?
  8. Prepare-se para o inesperado – No final você verá a felicidade de seus filhos por terem vencido o desafio. Eles vão pedir novos desafios. E essa será a hora de sugerir os planos de médio e longo prazo..

Não é um processo rápido, mas também não demora tanto quanto você pode estar imaginando. O mais importante é você entender que é um método que eu adoto, método que eu criei, e que, por acreditar e confiar nele, estou compartilhando com vocêFique à vontade para modificar, incluir ou excluir alguma parte. Se preferir, faça deste método um esboço, modifique e depois me conte! Terei prazer em conhecer!!!

Falo por mim. Pai de duas meninas, Carolina (9 anos) e Letícia (6 anos) (isso em junho/2020). As duas já sabem que abrir mão de algo agora não é um sacrifício apenas. É o adiamento de uma recompensa, que será muito maior daqui a pouco…

Fique à vontade para compartilhar, criticar e até mesmo utilizar este método. Quando a gente descobre algo que dá sucesso quer logo que mais pessoas também consigam em suas vidas.

#multixplique

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